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quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Ainda sobre gentilezas...

Há uma frase no meu livro Anáguas que diz o seguinte:
Tudo que é prático não é gentil.

Parece que radicalizo completamente  e que não acredito nas atitudes objetivas e ações práticas, mas não é verdade, não de todo. É claro que é mais prático que aquele amigo que não vemos á muito tempo e vem à cidade nos visitar, tome um táxi até nossa casa, ao invés de irmos esperá-lo no aeroporto. É claro que quando adoecemos precisamos, de maneira objetiva, daquele que nos leva ao hospital, daquele que fica conosco em razão do repouso e da convalescença, ministra os remédios... Mas também é claro  como o apoio e afeto nos cura com maior rapidez e menos sofrimento. É claro, também, que marcar com a namorada de encontrá-la no restaurante, ao invés de pega-la em casa e demorar no trânsito, é mais inteligente e prático.

E os vale-presentes, tão em moda? E os vale-CD? Mais fáceis, mais práticos. Que terrível! Tão mais gostoso e significativo ouvir uma música que nos foi presenteada por aquele querido, e do qual nos lembraremos sempre que a ouvirmos; um CD é só um objeto. Ou colocar aquele lenço colorido que ganhamos da assistente e vê-la feliz por ter acertado o mimo, mesmo que não tenha; o que importa?!

De minha parte, sempre abominei os vale qualquer coisa, porque neles não vem o afeto da escolha, da busca por algum objeto ou gesto que vá nos agradar, não vem junto do vale. Ou a praticidade dos convites de alguns amigos: Aparece lá!

Entendo que em muitos momentos, nessa cidade caótica, somos forçados a ser práticos e pra lá de objetivos, mas tenho a forte convicção de que devemos observar mais nossos gestos e atitudes com nossos queridos, e tentar, ao menos de vez em quando, usar a subjetividade do afeto e do amor em nossas ações e gestos. Viver o que é considerado , em tempos modernos,desnecessário.

Um telefonema sem razão objetiva, no meio do dia, para dizer um olá a um filho, mãe ou amigo, uma flor para a sócia, antes da reunião, passando na feira, no caminho. Um doce para a secretária do dentista, na volta do almoço. Um livro, um aperto de mão no vizinho,um bom dia no elevador, um sorriso para o porteiro, um olá para a faxineira do escritório e uma prosinha rápida( por que não?) sobre qualquer coisa, com quem passar pelo nosso dia. 

Dias de rotina, atarefados, duros, que ganham brilho quando lembramos que não estamos sós e compartilhamos a alegria de estarmos vivos e, não por uma coincidência, debaixo do mesmo céu ao mesmo tempo. E a certeza de que em nossos dias passamos mais tempo com quem achamos ser coadjuvantes do que com quem julgamos principais; então, prestemos mais atenção a esses seres do nosso dia a dia também. Para eles, também somos coadjuvantes, a mão é dupla nessa estrada, mas pode ter canteiros e mirantes.

Sejamos gentis, mais do que práticos!
Nossas vidas não vão parar por isso, nem a cidade, nem os compromissos, nem os problemas ou dores, mas certamente tudo ficará mais leve, mais fluido, mais fácil, e seremos mais felizes!

Tudo que é prático não é mesmo gentil.

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